Aspecto delicioso. Recheio de amêndoa, com cor de perdição. Massa brilhante, convidativa. Confesso, fiquei balançada pela trufa que se insinuava logo ao lado. Afinal, no Olimpo dos doces, chocolate é Zeus. Mas desta vez optei pela dionisíaca torta de amêndoas.
– Boa pedida. Ela é a especialidade da casa.
Na primeira mordida admirei a textura do recheio. Foi a massa, porém, que me surpreendeu.
– Vai uma dose de pinga que faz toda a diferença. – me confidenciou a moça enquanto me servia água.
E segui para a segunda mordida, certa que aquela tortinha faria a minha tarde mais feliz. O sabor inicial explodiu até o céu da boca. Mas bateu certa culpa: há tempos não comia doce à luz do dia, ainda queria expurgar dois intrusos quilos que se instalaram em meus quadris desde um feriado gastronômico na casa de um amigo cozinheiro.
A terceira mordida foi com vontade: “primeiro o prazer, depois a culpa.”, lembrei do conselho nada ortodoxo de meu pai. E minha boca entorpecida pelo doce agradeceu meu progenitor.
A quarta mordida, afobada, não teve gosto, só hábito. Tal qual cigarro com café depois do almoço para aqueles que fumam e tomam café.
Água. Boca limpa. Com a derradeira mordida veio um amargor imprevisível. Mas como amêndoa, açúcar, manteiga, farinha podem amargar uma boca? Pois foi o que aconteceu. O prazer inicial deu lugar a sensações desagradavelmente familiares. Estômago um tanto embrulhado. Leve inchaço. Esôfago afogueado e boca, putz, boca inerte.
E, assim, me deparo com uma intolerância que jamais imaginei me antigir.
Amêndoa nunca mais. Se for transgredir, fuja dos intolerantes.

Este post tem 2 comentários
Paulina
22 mar 2019será que não foi a pinga na massa???????
as ilustrações do Tomás são sempre muito pertinentes, e lindas!!!!
Luciana Pinsky
17 jul 2019Talvez… obrigada!!